Alcançar um bom desempenho em Saúde e Segurança no Trabalho tem sido uma das grandes preocupações das organizações, seja pelo rigor da legislação ou por questões relacionadas aos seus valores e políticas internas.
Ações de compliance, treinamento e qualificação dos trabalhadores, medidas de proteção coletivas e individuais, investigar seriamente os acidentes de trabalho são exemplos de boas práticas atribuídas às organizações.
Do ponto de vista de um sistema de gestão de SST, a participação e colaboração dos trabalhadores por meio de sugestões de práticas seguras e medidas de controle em prol da SST representam um fator de sucesso, pois o profundo conhecimento do trabalhador acerca da atividade e dos riscos a ela associados pode ser decisivo na eficácia das medidas de proteção e sistema de controle. Pode-se afirmar que, sem a participação do trabalhador, o bom desempenho em SST estará comprometido.
Dito isto, levanta-se a questão sobre como as organizações podem criar um ambiente que estimule o comportamento participativo do trabalhador, de forma genuína, proativa e voluntária, no que se refere à busca de soluções dos problemas de saúde e segurança, por meio de ideias e sugestões criativas e inovadoras. Emergem-se indagações sobre quais as práticas mais apropriadas e eficazes para motivar e estimular o trabalhador a adotar comportamentos positivos de SST, quais estratégias podem ser adotadas pelas organizações ou quais programas devem ser implementados.
Este artigo foi buscar as respostas na literatura acadêmica sobre o comportamento organizacional, tendo como ponto de partida os pressupostos das cinco teorias centrais sobre motivação organizacional, e nos estudos que tratam da associação de programas de mudanças e reforço de comportamento dos indivíduos por meio de recompensas financeiras ou não financeiras.
ENDÓGENAS
De forma resumida, as teorias da motivação humana se diferenciam fundamentalmente pela explicação sobre como se processam no indivíduo. Isto é, se a motivação é um fenômeno psicológico que se processa dentro de sua mente (teorias endógenas) ou se é um efeito de contextos e influências externas que podem ser alterados pela organização (teorias exógenas).
De um modo geral, as teorias endógenas se apoiam fortemente na ideia da compensação pelos feitos ou resultados alcançados. Para a Teoria da Expectativa de Victor Vroom (1964), por exemplo, um trabalhador se esforça para realizar uma tarefa somente se acreditar que tem condições de atingir a meta proposta e que tal feito seria importante e valorizado pela organização. Por sua vez, para J. S. Adams, que desenvolveu a Teoria da Equidade, em 1965, um trabalhador se motiva quando o seu esforço é acompanhado por recompensas (pagamento, bônus…), desde que haja uma relação justa e proporcional entre a recompensa e o seu esforço.
EXÓGENAS
As teorias exógenas estão relacionadas a aspectos gerenciais, isto é, a empresa tem como alterar e ajustar parâmetros na busca pelos melhores resultados. Em 1968, foi proposta a Teoria da Determinação de Metas por John Locke, que sustentou a ideia de que, o estabelecimento de metas associadas a um sistema de feedback é um fator de motivação e que resulta em um melhor desempenho do trabalhador.
Para Locke, metas simples e desafiadoras estão mais associadas ao esforço das pessoas do que metas com algo grau de complexidade que exigem elevado nível de conhecimento do trabalhador. Em 1976, Hackman e Oldham estabeleceram a Teoria do Enriquecimento do Trabalho, sustentando que é fator de motivação do trabalhador ser designado para um trabalho desafiador, que tenha sentido e pleno significado, que seja relevante para a organização, que seja dada autonomia de escolhas e fornecidas informações sobre o seu desempenho e resultados obtidos (feedback).
Em 1981, estudos de Richard Ryan e Edward L. Deci levaram à publicação de uma consistente teoria que combina os dois pressupostos anteriores, isto é, o desejo interior de agir do indivíduo e a motivação provocada por condições externas. Trata-se da Teoria da Autodeterminação (STD) que se apoia na crença de que os indivíduos têm três necessidades intrínsecas básicas: autonomia, competência pessoal e o vínculo social. A autonomia refere-se ao sentimento de poder tomar decisões; a competência pessoal se refere ao sentimento de se sentir capaz e eficaz para executar os trabalhos, e o vínculo social refere-se aos sentimentos de estar bem relacionado, aceito e apoiado pelo grupo. Quando a organização consegue proporcionar ao indivíduo o alcance a essas três necessidades, este atinge um estado chamado de autodeterminação. Isto é, assume comportamentos e habilidades que dotam a pessoa de capacidade para agir e realizar coisas de forma intencional, bem como são mais propensos a internalizar as metas e os objetivos da organização.
DISCUSSÃO
O relacionamento entre recompensas financeiras ou não financeiras com o estímulo ao bom desempenho e mudanças ou reforço de comportamentos valorosos dos trabalhadores, apesar da polêmica sobre poderem ser utilizados como formas de manipulação dos indivíduos, continuam sendo adotados pelas organizações. Estudos apontam que recompensas financeiras (ex. aumentos salariais, gratificações, bônus e distribuições de lucro) tendem a satisfazer fatores higiênicos dos trabalhadores, têm impactos de curto prazo na motivação, não criam comprometimento, mudam as pessoas de forma temporária e representam custos relevantes para a organização. Por sua vez, as recompensas não financeiras, usualmente concedidas sob a forma de premiação a um esforço ou resultado obtido e relacionado a questões imateriais ou intangíveis (ex. oportunidades de um trabalho significativo, crescimento profissional, melhores condições na relação de trabalho e vida pessoal), são eficazes para a melhoria das habilidades, conhecimento, autoestima e competência das pessoas, atuam fortemente na motivação intrínseca e têm menor impacto nas despesas da organização. Dentro da categoria de recompensas não financeiras, os estudos incluem os chamados programas de reconhecimento, definidos como uma forma de agradecimento a um indivíduo por seu desempenho, resultado ou comportamento positivo e não diretamente relacionado ao alcance de metas estabelecidas. Por representar uma forma de agradecimento, aprovação ou gesto de gratidão, o reconhecimento pode variar de um simples agradecimento da chefia, um gesto ou citação elogiosa em um jornal interno ou intranet, bem como um programa estruturado com cerimônias formais e participação de plateia.
AÇÕES
Como proposto, este artigo foi buscar as respostas às indagações levantadas nos estudos acadêmicos e teorias consagradas da administração. Os pressupostos centrais das teorias da motivação, bem como os estudos sobre a associação entre reforço/mudança de comportamentos e os sistemas recompensas, nos possibilitam apontar ações, direcionamentos e pontos de reflexão, listados a seguir. Os quais devem ser considerados pelas organizações ao implementarem programas de motivação e estímulo dos trabalhadores para comportamentos positivos de SST. É fator de motivação do trabalhador possibilitar o uso de sua capacidade intelectual nas questões de SST por meio do estabelecimento de metas específicas, atingíveis e que possam ser desdobradas em atividades ou tarefas importantes, úteis e significativas para a organização; A importância e demonstração de valor dos trabalhos em prol da SST dentro da organização pode ser evidenciada por meio de ações tais como a publicidade interna e o envolvimento da alta administração; Pesquisas apontam que os programas de reconhecimento são a forma mais apropriada de se motivar os trabalhadores para mudar atitudes ou reforçar comportamentos seguros, tais como cumprimento de regras de segurança, participação proativa e colaborativa nas questões de SST, dentre outros; Na hipótese de se optar pelo sistema tradicional de recompensa associado à motivação para ações em prol da SST, deve-se considerar que a transparência e o senso de justiça na distribuição das recompensas devem ser tratadas como itens de extrema relevância. Uma vez que a percepção de injustiça ou de recompensa desproporcional aos feitos conseguidos pode diminuir a motivação das pessoas e afetar negativamente o seu desempenho; Ao optar-se pela estratégia de estabelecer metas desafiadoras para motivar os trabalhadores em prol da SST, deve-se considerar a disponibilização de sistema de acompanhamento e feedback sobre o desenvolvimento dos trabalhos e dos resultados alcançados; Considerar fortemente a concessão de certa autonomia organizacional como fator diretamente relacionado à motivação dos trabalhadores, pois estudos comprovam que a autonomia oferece ao indivíduo uma perspectiva desafiadora e possibilita a satisfação no trabalho, observando-se os limites e regras internas da organização.
HARMONIA
As ações e direcionamentos listados anteriormente, propiciam alguns fundamentos para a implementação de programas de motivação do trabalhador para os temas de SST. Porém, é imprescindível a harmonização destes com as questões internas da organização, tais como a cultura organizacional, valores, políticas e ambiente de trabalho. Do ponto de vista dos programas de reconhecimento, interessante registrar que há extensa literatura sobre inúmeras práticas de sucesso adotadas por outras organizações, que permitem aos leitores conhecerem e avaliarem o mérito e a aplicabilidade dos programas de reconhecimento em suas organizações, destacando como referência os trabalhos de Bob Nelson publicados em 2014. Enfim, é oportuno citar os estudos dos pesquisadores Álvaro Tamayo e Tatiane Paschoal, de 2003, ao estabelecerem que o problema da motivação do trabalhador para as questões do trabalho passa pela interação dos seus interesses com os interesses da organização. A criação de um ambiente de trabalho seguro e sem acidentes converge para os interesses das partes, podendo ser divergentes quanto aos pontos de vista. É certo que as duas partes têm suas exigências e demandas específicas, mas que ao final devem ser harmonizadas e convergirem para uma mesma direção.
Fonte: Revista Proteção